Globetrotter by Harold Emert

Este amante do teatro está sempre interessado na programação do Teatro Poerinha do Rio, pois duas atrizes renomadas do cenário teatral brasileiro, Marieta Severo e Andrea Beltrao, são proprietárias e dirigem este empreendimento artístico não comercial, porém de alta qualidade, em uma cidade repleta de farmácias em vez de livrarias e cinemas de arte.

Atualmente em cartaz no anexo da Poeira, o Teatro Poeirinha, após temporadas de sucesso na capital teatral do Brasil, São Paulo, em residência de terça a domingo desde 6 de novembro, está “ANONYMOUS SHOWCASE – três peças solo de autoras”.

O projeto lança luz sobre o silenciamento histórico das artistas mulheres e é composto pelas peças solo:

“CREATURE, AN AUTOPSY” de Bruna Longo, “INVENTORY” de Erica Montanheiro e “THAT TRAIN” de Denise Dietrich.

Convidada a assistir à comovente história pessoal de Dietrich, sobrinha-neta da superestrela de cinema germano-americana Marlene Dietrich (1901, Berlim – 1992, Paris), saí com a sensação de ter vivenciado uma experiência reveladora, que ilumina não apenas a vida da atriz e dramaturga, mas a existência de todos nós.

A Sra. Dietrich, de 45 anos, natural de Resplendor (17.629 habitantes), Minas Gerais, demonstra sozinha no palco, pulando corda, andando de bicicleta, brincando de jogos infantis e refletindo sobre seus traumas de infância (“um tio me beijou na boca quando eu tinha seis anos”, etc.), que somos consequências de muitos acontecimentos que a maioria de nós esqueceu ou prefere esquecer.

E como em inúmeras sessões de psicanálise (no caso da Sra. Dietrich, lacaniana), essas boas e más lembranças da infância e educação de Denise, seus jogos infantis, sonhos e pesadelos, e como ela foi (mal)tratada por seus mais velhos emergem neste perspicaz monólogo de 80 minutos que parece ter mais de um ator no palco.

No caso de Denise, ela enfrentou um pai supermachista, dono de uma fazenda, que no “cu do mundo” — como ela descreve em seu quadro-negro — rotulou sua ambição de seguir os passos da internacionalmente famosa tia Marlene como “prostituição”, apesar de seu pai ter muito orgulho dela.

As frustrações e o sofrimento de Denise em sua infância em uma sociedade machista, como era o Brasil na época (e continua sendo), não eram apenas um caso único, mas parte do cenário daqueles tempos sombrios em que mulheres saindo sozinhas para restaurantes, dirigindo ou mesmo viajando sozinhas eram vistas com maus olhos.

Sua fuga da vida provinciana emocionalmente sufocante foi pegar — como sua mãe fez quando Denise tinha seis anos — “Aquele Trem” (para São Paulo), título de seu livro de memórias que resultou no monólogo.

Em uma entrevista de 2022, Denise afirma corretamente: “Minha diretora (Erica Montanheiro) diz que quanto mais íntima e pessoal for a sua história, mais universal ela se torna.” Com certeza!

Monólogos podem se tornar cansativos, mas não este, que é enriquecido por uma sequência de filme pré-gravada com a “Tia” Marlene.

Outras peças solo percorrem três séculos, atravessando os universos da literatura, através da escritora Mary Shelley (1797-1851) e seu Frankenstein, no século XIX; As artes visuais, através da escultora Camille Claudel (1864-1943), que viveu à sombra de seu amante e escultor Auguste Rodin, no século XX.

HORÁRIOS:

“AQUELE TREM” – Terças e quartas, às 20h

“CRIATURA, UMA AUTÓPSIA” – Quintas e sextas, às 20h

“INVENTÁRIO” – Sábados, às 20h, e domingos, às 19h

INGRESSOS: R$ 80,00 e R$ 40,00 (meia-entrada) em www.sympla.com.br ou na bilheteria de terça a sábado, das 15h às 20h, e domingos, das 15h às 19h / CAPACIDADE: 50 lugares / DURAÇÃO: “Aquele Trem” (80 min) / “Criatura, Uma Autópsia” (70 min) / “Inventário” (60 min) / GÊNERO: drama / CLASSIFICAÇÃO INDICATIVA: 12 anos / ACESSIBILIDADE: sim / TEMPORADA: até 21 de dezembro

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